(Márcio Xavier)
Sem querer chover no molhado – literalmente –, essas chuvas que estão desabando em São Paulo nos últimos dias sugeriram-me uma reflexão: o quanto a lei da causa e efeito é implacável. Minhas escolhas filosóficas não me permitem pensar em castigos divinos, vinganças da natureza e animismos congêneres. Porém, se for verdade que O homem é o lobo do Homem(*), podemos dizer o mesmo, a respeito das matrizes que regem o tipo de progresso que construímos. Erigimos cidades abarrotadas de gente e não entendemos os porquês da violência urbana.
Colocamos nas ruas milhões de carros, ao invés de trens e metrô, e não entendemos por que há tanto trânsito e poluição. Impermeabilizamos o solo, jogamos lixo e entulho nas ruas, mas quando há enchentes culpamos as prefeituras e estas, por sua vez, culpam São Pedro. A ladainha é sempre a mesma: “Caiu em 2 dias a chuva esperada para o mês todo”. Ora bolas, nesse caso será que a expectativa de chuva não estaria furada? Em dezembro último, viajei de carro com a família pelo trecho fluminense da BR-393. Passei por um vilarejo, o qual tínhamos visto encoberto pela enchente na viagem anterior, em janeiro de 2010.
Na ocasião, nos espantamos com uma multidão de desabrigados à beira da estrada. No local inundado, mal se via o telhado de uma igreja, que mal ficara para fora da cheia do rio Paraíba do Sul. Intrigado, comentei com minha esposa o fato de que a vila situava-se a poucos metros do leito menor do rio. Observando o entorno podíamos perceber outra calha, mais ampla. Ela parecia corresponder aos limites mais altos do rio, quando ele está em cheia.
Contudo, nessa última viagem, notamos que o vilarejo estava novamente lá, restabelecido no mesmo local. Durante uma parada na região, ouvi alguém comentando que fazia 20 anos que não se via tal cheia do Paraíba. Aí é que me pareceu estar o problema: o ser humano presume que, se ficou uma ou duas décadas sem transbordar, o rio deva ficar quietinho no seu leito, sem perturbar a vida daqueles que se apoderam das suas margens.
Chega a parecer ingênuo. Tão ingênuo quanto rezar e pedir, a quem tenha criado a natureza, a transgressão das próprias leis naturais. Reflitamos: será que um ser superior criaria algo e estabeleceria regras para esse algo para, depois, para atender a caprichos humanos, ir lá e mudar as leis estabelecidas ordenando ao Paraíba que deixe os humanos em paz? Ou será que errados estão os humanos, com seus modos civilizadores, que implicam em ignorar solenemente os ditames da natureza? Pois é, meus caros leitores, tudo na vida são escolhas.
As cidades superpopulosas, os bairros, os prédios, as estradas, a concretagem e o asfaltamento do solo, são todas ações artificiais, do homem e das sociedades que ele cria. Me parece muito fácil ver quem são os culpados pelas catástrofes, aparentemente causadas pela chuva. Eu mesmo acabo de ver um.
No espelho do meu banheiro, quando fui fazer a barba.
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(*) O homem é o lobo do Homem. Frase de Plauto (230-180 aC), mais tarde reproclamada por Hobbes, no séc. XVIII.
Fonte: Primeiro Programa
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Sem querer chover no molhado – literalmente –, essas chuvas que estão desabando em São Paulo nos últimos dias sugeriram-me uma reflexão: o quanto a lei da causa e efeito é implacável. Minhas escolhas filosóficas não me permitem pensar em castigos divinos, vinganças da natureza e animismos congêneres. Porém, se for verdade que O homem é o lobo do Homem(*), podemos dizer o mesmo, a respeito das matrizes que regem o tipo de progresso que construímos. Erigimos cidades abarrotadas de gente e não entendemos os porquês da violência urbana.
Colocamos nas ruas milhões de carros, ao invés de trens e metrô, e não entendemos por que há tanto trânsito e poluição. Impermeabilizamos o solo, jogamos lixo e entulho nas ruas, mas quando há enchentes culpamos as prefeituras e estas, por sua vez, culpam São Pedro. A ladainha é sempre a mesma: “Caiu em 2 dias a chuva esperada para o mês todo”. Ora bolas, nesse caso será que a expectativa de chuva não estaria furada? Em dezembro último, viajei de carro com a família pelo trecho fluminense da BR-393. Passei por um vilarejo, o qual tínhamos visto encoberto pela enchente na viagem anterior, em janeiro de 2010.
Na ocasião, nos espantamos com uma multidão de desabrigados à beira da estrada. No local inundado, mal se via o telhado de uma igreja, que mal ficara para fora da cheia do rio Paraíba do Sul. Intrigado, comentei com minha esposa o fato de que a vila situava-se a poucos metros do leito menor do rio. Observando o entorno podíamos perceber outra calha, mais ampla. Ela parecia corresponder aos limites mais altos do rio, quando ele está em cheia.
Contudo, nessa última viagem, notamos que o vilarejo estava novamente lá, restabelecido no mesmo local. Durante uma parada na região, ouvi alguém comentando que fazia 20 anos que não se via tal cheia do Paraíba. Aí é que me pareceu estar o problema: o ser humano presume que, se ficou uma ou duas décadas sem transbordar, o rio deva ficar quietinho no seu leito, sem perturbar a vida daqueles que se apoderam das suas margens.
Chega a parecer ingênuo. Tão ingênuo quanto rezar e pedir, a quem tenha criado a natureza, a transgressão das próprias leis naturais. Reflitamos: será que um ser superior criaria algo e estabeleceria regras para esse algo para, depois, para atender a caprichos humanos, ir lá e mudar as leis estabelecidas ordenando ao Paraíba que deixe os humanos em paz? Ou será que errados estão os humanos, com seus modos civilizadores, que implicam em ignorar solenemente os ditames da natureza? Pois é, meus caros leitores, tudo na vida são escolhas.
As cidades superpopulosas, os bairros, os prédios, as estradas, a concretagem e o asfaltamento do solo, são todas ações artificiais, do homem e das sociedades que ele cria. Me parece muito fácil ver quem são os culpados pelas catástrofes, aparentemente causadas pela chuva. Eu mesmo acabo de ver um.
No espelho do meu banheiro, quando fui fazer a barba.
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(*) O homem é o lobo do Homem. Frase de Plauto (230-180 aC), mais tarde reproclamada por Hobbes, no séc. XVIII.
Fonte: Primeiro Programa
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